A BRF S.A. foi condenada a pagar R$ 150 mil por danos morais a uma funcionária venezuelana que perdeu as filhas gêmeas ao entrar em trabalho de parto na portaria da empresa, durante o expediente, sem receber o atendimento médico necessário. A decisão é de 21 de maio e foi assinada pelo juiz da 2ª Vara do Trabalho de Lucas do Rio Verde (a 360 km de Cuiabá), Fernando Henrique Galisteu.
A decisão também reconheceu a rescisão indireta do contrato de trabalho, obrigando a empresa a pagar verbas rescisórias, FGTS e multa de 40%. O valor originalmente pedido na ação ultrapassava R$ 600 mil.
O caso ocorreu no dia 22 de abril de 2024, quando a trabalhadora, grávida de oito meses, começou a passar mal no início do turno. Segundo a sentença, mesmo após relatar fortes dores e pedir ajuda à liderança da equipe, ela não foi levada ao setor médico da empresa, nem recebeu transporte adequado para atendimento hospitalar.
Sem alternativa, a empregada deixou a linha de produção sozinha, sentou-se em um banco na portaria e deu à luz as duas filhas, que nasceram sem vida ou faleceram logo após o parto, segundo os autos. A empresa só acionou o socorro após o parto e não comprovou ter seguido os protocolos internos para atendimento a gestantes.
Na decisão, o juiz Fernando Henrique destacou que a BRF tinha pleno conhecimento da gravidez, pois havia alterado a função da funcionária durante a gestação. Ainda assim, não ofereceu as condições mínimas previstas em lei para mulheres grávidas, como cadeira para descanso ou prioridade no atendimento médico. A empresa também não acionou o Serviço Especializado em Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT) a tempo, embora tivesse estrutura disponível.
A conduta foi considerada omissiva e negligente, principalmente diante da vulnerabilidade da funcionária, por ser gestante, imigrante e em situação de risco.
“No caso dos autos, trata-se de ofensa de natureza inequivocamente gravíssima, considerando a natureza do bem jurídico tutelado (perda simultânea de duas filhas), a intensidade do sofrimento e humilhação (partos no banco da portaria da ré, sem assistência adequada), a possibilidade de superação psicológica (de longa duração), os reflexos pessoais da omissão (interseccionalidade)”, diz trecho da decisão.
O que alegou a BRF
No processo, a BRF alegou que o parto não ocorreu dentro de suas dependências, mas em um ponto de ônibus externo, sem controle da empresa. Afirmou também que não havia sido informada sobre risco na gestação, que a empregada era pontual e não apresentou atestados médicos, e que teria recusado atendimento pelo SESMT, dizendo que seu marido já estava a caminho.
Ainda segundo a BRF, a funcionária foi liberada do posto de trabalho, não solicitou atendimento médico e foi registrada apenas com mal-estar. A empresa também afirma que não houve omissão de socorro, e que os fetos nasceram sem vida, como consta nas certidões de óbito.
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