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Entrevista da Semana Sábado, 09 de Março de 2024, 18:20 - A | A

Sábado, 09 de Março de 2024, 18h:20 - A | A

Entrevista da Semana

Secretária fala dos desafios e a necessidade de políticas inclusivas na Educação

Segundo a secretária, é preciso preparar toda a rede municipal de ensino para atender aluno autista

Adriana Assunção & Edina Araújo/VGN

A secretária municipal de Educação, Esporte e Cultura de Sinop, localizada a 503 km de Cuiabá, Sandra da Conceição Donato Ferreira, enfatizou a importância da parceria com a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) Mato Grosso. Destacou o papel dessa cooperação na formação profissional e nos avanços para a criação de um ambiente inclusivo destinado aos estudantes com autismo.

A secretária ressaltou a necessidade de preparar toda a rede municipal de ensino para a inclusão de alunos autistas. Isso inclui desde o porteiro, merendeira até os professores. “Em Sinop, tivemos um caso em que um professor – para conter o aluno - deu um murro na cara do estudante, que era autista. Isso gerou mídia nacional. Temos trazido esse assunto para a Undime, no ano passado no encontro da Undime, houve-se bastante discussão. É preciso estabelecer qual a política pública”, destacou a secretária.

Sandra da Conceição abordou a importância do respeito às diversas religiões nas salas de aula, destacando a influência das famílias nesse contexto. "Enfrentamos situações em que atividades como recitar o 'Pai Nosso' ou cantar o 'Homenzinho Torto' ocorrem dentro da sala. Apesar de o ensino religioso ser integrado ao currículo, ele é tratado transversalmente pelas diferentes disciplinas, sem constituir uma matéria específica", afirmou a secretária.

Donato abordou as dificuldades financeiras enfrentadas para manter escolas em tempo integral, o custo do transporte de estudantes pelo município sem apoio estadual, o atendimento aos estudantes do campo e expressou sua opinião sobre a educação em escolas militares. Quanto às escolas militares, a secretária afirmou que a presença dos militares nas unidades escolares apoia os profissionais da educação. Isso ocorre em um contexto em que os pais, cada vez mais, delegam responsabilidades educacionais à escola. Ela defende que as unidades militares de ensino deveriam acolher um maior número de estudantes da periferia, promovendo uma maior inclusão.

“A escola militar, em essência, é uma escola estadual que conta com o apoio dos militares para auxiliar na educação dos alunos. Essa colaboração se faz ainda mais relevante em um cenário onde as famílias vêm, progressivamente, transferindo para as escolas responsabilidades que tradicionalmente seriam suas. Esse fenômeno resulta em uma redução do papel ativo das famílias no processo educativo”, opinou a secretária.

Confira abaixo entrevista na íntegra

VGN: Quais são os desafios para manter uma escola em tempo integral no seu município?

Sandra: No município de Sinop, já contamos com duas escolas em tempo integral e estamos avançando para a construção de uma terceira. A operacionalização em tempo integral demanda recursos significativos, constituindo nosso principal desafio. Isso se deve, em parte, ao rápido crescimento do município e à expansão do atendimento educacional. Iniciamos a gestão com 17 mil alunos e, atualmente, atendemos 24 mil. Manter o modelo de tempo integral requer um comprometimento considerável da gestão municipal, especialmente no que tange aos recursos financeiros. Observamos, contudo, uma expansão deste tipo de atendimento por parte do Governo Federal, o que tem beneficiado os municípios.

VGN: O Governo do Estado contribui com recursos para essas iniciativas? Ou os recursos vêm exclusivamente do governo municipal e federal?

Sandra: Até o presente momento, observamos que as políticas de apoio estão predominantemente focadas no âmbito federal. No que tange ao Estado, ainda não dispomos de uma política específica de apoio, principalmente porque estamos em um período de transição e redimensionamento das responsabilidades entre o Estado e os municípios. Atualmente, o Estado é responsável pelo atendimento educacional do 6º ano do ensino fundamental até o ensino médio, enquanto os municípios focam na educação infantil até o 5º ano. No contexto deste redimensionamento, o Estado tem oferecido auxílio aos municípios em determinadas situações, especialmente no que se refere a recursos financeiros.

VGN: Quais são os avanços educacionais e estruturais alcançados para atender os estudantes do campo e de assentamentos?

Sandra: Em meu município, dispomos de duas escolas que operam em parceria com o Estado. Esse atendimento é realizado de forma compartilhada, uma estratégia necessária para evitar longas distâncias no transporte dos alunos. Atualmente, o município e o Estado dividem as responsabilidades: enquanto o Governo Estadual gerencia as operações escolares, o município contribui fornecendo merenda, uniformes e suporte para as turmas municipais. Desta forma, a gestão escolar, no que tange às instalações compartilhadas, é integralmente conduzida pelo Estado.

VGN: O município não tem gestão nesse caso?

Sandra: Não, no caso das escolas do campo, o município não exerce gestão. Isso ocorre porque, conforme o acordo de redimensionamento estabelecido, ficou decidido que o Estado seria responsável pela gestão dessas duas instituições.

VGN: Qual é o número de alunos que residem ou estão situados nesses assentamentos ou no campo?

Sandra: Atualmente, em Sinop, contabilizamos cerca de 500 alunos em um esquema de atendimento compartilhado com o Estado.

VGN – As crianças do campo ou de assentamentos têm acesso a um meio de transporte oferecido pelo município?

Sandra - Sim, atualmente, o município é responsável pelo transporte e pelo gerenciamento desse serviço nas áreas rurais, enquanto o Governo do Estado contribui com o repasse de recursos, exclusivamente para os alunos do campo. É importante ressaltar que, no município de Sinop, a situação é particularmente relevante no que diz respeito ao transporte na zona urbana, onde o financiamento de todo o transporte escolar é assumido pelo município, com recursos próprios, sem auxílio financeiro do Governo do Estado. Atendemos, assim, mais de 4 mil alunos estaduais na zona urbana por meio desse transporte.

VGN: Qual é a justificativa do Governo do Estado para não efetuar o repasse dos recursos destinados ao transporte de alunos na zona urbana?

Sandra: A legislação estadual atualmente só autoriza o repasse de recursos para o transporte de alunos em zonas rurais, excluindo assim a zona urbana. Diante disso, nos deparamos com um impasse. O município de Sinop destaca-se como o único em que tal impasse ocorre com o Governo do Estado. A situação tem se mostrado extremamente desafiadora para nós, especialmente em 2024, quando houve um significativo aumento na demanda pelo serviço de transporte. Temos reiteradamente solicitado ao Governo do Estado que promova a construção de escolas nos bairros, uma medida urgente considerando a prolongada ausência de investimentos estatais nessa área. A carência de infraestrutura escolar resulta no transporte diário de um grande número de alunos. Adicionalmente, a inexistência de transporte coletivo urbano em nosso município agrava a dificuldade de atender a essa demanda.

VGN: Qual é o custo para o município? Sinop precisa investir qual valor para suprir a necessidade desses alunos não custeado pelo Estado?

Sandra: Este ano nós fizemos a licitação, ela girou em torno de quase R$ 20 milhões para fazer esse atendimento de toda a zona urbana no município de Sinop, ao que se refere aos alunos.

VGN: Educação religiosa, como o tema é tratado com os alunos no seu munícipio?

Sandra: Ele é incluso dentro do currículo e o professor ele aborda dentro das disciplinas. Nós não temos uma disciplina específica de ensino religioso.

VGN: Qual é a sua opinião sobre a Educação Religiosa?

Sandra: A questão da Educação Religiosa é bastante delicada nos dias atuais, considerando os diversos questionamentos provenientes das famílias. Por exemplo, a prática de recitar um 'Pai Nosso' ou cantar 'Homenzinho Torto' em sala de aula já enfrentou objeções de algumas famílias, que não concordam com essas atividades. Por isso, é essencial que exerçamos o máximo de cautela. Sendo as escolas laicas, é nosso dever respeitar as diferentes crenças religiosas. Nós, profissionais da educação, precisamos ser extremamente cuidadosos em como abordamos esses conteúdos. Pessoalmente, acredito que deveríamos enfatizar o ensino de ética e civismo, entre outros temas, pois o campo da religião é particularmente sensível atualmente. A discussão sobre educação religiosa com as famílias é complexa e, dependendo da interpretação de cada família, pode resultar em processos judiciais e outras complicações para a escola. Portanto, embora o tema seja abordado pelos nossos professores dentro do currículo, ele é tratado de maneira diferenciada.

VGN: Violência, como que vocês lidam, no caso com estudantes mais agressivos, seja na questão psicológica ou integração com a família?

Sandra: Hoje temos várias situações, temos a contratação de 10 psicólogos e também temos a contratação de assistentes sociais, então, quando ‘acende a luzinha’ que temos esse tipo de situação, eles passam por uma triagem, com esses especialistas que estão dentro da instituição. Eles fazem um acompanhamento, chamam as famílias para conversar, para dialogar, para a gente fazer uma intervenção.

VGN: Há muitos casos de alunos agressivos ou que necessitam de acompanhamento psicológico na escola?

Sandra: Em nossa atuação, que abrange da educação infantil até o 5º ano, não identificamos uma prevalência de casos de agressividade específicos. No entanto, enfrentamos vários casos de alunos que apresentam transtornos diversos. Atualmente, observamos nas escolas, em uma perspectiva ampla no estado do Mato Grosso, um número significativamente alto de crianças com variadas deficiências, incluindo casos de autismo. Notadamente, alguns alunos com autismo severo podem apresentar comportamentos agressivos. Isso ocorre, em parte, porque os profissionais da educação muitas vezes não estão adequadamente preparados para realizar intervenções ou contenções eficazes. Essa falta de preparo específico pode levar a situações em sala de aula que, aos olhos da comunidade, pareçam ser agressões, mas na realidade são manifestações da dificuldade dos educadores em lidar com tais comportamentos devido à ausência de formação específica nesse aspecto.

VGN: Como resolver essa questão? Recentemente, em Brasília, ocorreu um incidente envolvendo um aluno autista que resultou em violência, gerando repercussão nacional negativa para a escola.

Sandra: Vivenciamos um caso similar, em que um professor, na tentativa de conter um aluno autista, agrediu-o fisicamente. Esse episódio também teve ampla cobertura da mídia nacional. No último encontro da Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação), esse tema foi amplamente debatido, contando inclusive com a participação de Silvio e Eduardo, que convidaram especialistas para discutir sobre o autismo. Acredito que é imprescindível envolver o Ministério Público e a Defensoria Pública para definir políticas públicas claras. Estamos questionando como o Governo Federal está abordando essa questão, pois os municípios estão sobrecarregados.

Com uma média de 30 a 40 alunos autistas por escola, como podemos garantir o acompanhamento adequado? A legislação atual assegura o direito dos alunos autistas a um acompanhante especializado, mas os recursos necessários para proporcionar esse atendimento adequado não são disponibilizados aos municípios.

Precisamos avançar nas políticas públicas, tanto em termos de formação profissional quanto na inclusão efetiva nas escolas. Nossas escolas, no momento, são mais exclusivas do que inclusivas. Ser inclusivo significa ter desde o porteiro até o gestor preparados para acolher essas crianças, o que atualmente não ocorre. Apesar dos desafios, estou otimista de que haverá progresso, dada a intensa discussão e debate sobre o assunto. Creio que o Governo Federal ampliará as políticas públicas para assegurar o suporte necessário às escolas.

VGN: Como você avalia a evolução educacional nos últimos anos, e de que forma a Undime tem contribuído para esses avanços?

Sandra: A Undime tem sido uma parceira fundamental. Sempre pronta a oferecer suporte frente às diversas discussões e desafios, ela tem desempenhado um papel crucial no auxílio aos municípios, promovendo o debate sobre políticas educacionais em voga. Observamos significativos avanços educacionais no Brasil, especialmente no que tange à aprendizagem. É imprescindível reconhecer e parabenizar o Governo do Estado por seu olhar atento e apoio aos municípios nesse aspecto, incentivando todos a se mobilizarem em prol da evolução do ensino e da aprendizagem. O Estado de Mato Grosso, que antes enfrentava desafios consideráveis na qualidade do ensino, hoje apresenta resultados encorajadores. Da mesma forma, o Governo Federal tem sido um protagonista nesse processo, implementando, especialmente no último ano, diversas ações e políticas voltadas para o fortalecimento da educação.

VGN: Sinop possui escolas militares? Qual é a sua opinião sobre esse modelo de ensino?

Sandra: Existe um equívoco comum a respeito das escolas militares, que, na verdade, são instituições estaduais com suporte de militares no processo educacional. Esse modelo se destaca pela introdução de valores como ética e respeito, enfatizando a formação cidadã dos estudantes, habilidades estas que tradicionalmente seriam responsabilidade da família. No entanto, observa-se uma tendência cultural de as famílias delegarem tais responsabilidades à escola.

Sou uma defensora do modelo de ensino militar, tendo experiência pessoal positiva com ele: minha filha foi aluna de uma escola militar, e tenho um filho que é primeiro-tenente do Exército. Apesar de haver certa resistência a esse modelo, percebe-se que os estudantes que o completam tendem a desenvolver uma cidadania exemplar. O currículo acadêmico é o mesmo das escolas estaduais, não havendo diferença no conteúdo lecionado. O que distingue as escolas militares é a ênfase na disciplina, no respeito e na ética, preparando os jovens para compreenderem seu papel enquanto cidadãos ativos na sociedade.

VGN: Não fica desigual, secretária? Considerando que apenas alguns, poucos alunos, têm acesso a esse tipo de educação, em detrimento de outros. O Estado precisa investir mais. Um militar reformado ganha 3 até 4 vezes a mais do que um professor, isso não é uma forma de exclusão?

Sandra: Concordo, concordo com você, então, eu penso que é uma política que deveríamos questionar o próprio Governo do Estado, se é uma política que ela dá certo, os pais eles visualizam que deu certo. As crianças, os adolescentes que passam pelo ensino, cada vez mais nós temos a procura, infelizmente, ela é uma escola celetista. E ela não está abrindo portas realmente para aquele aluno que necessita, que é aquele que está lá no bairro, que às vezes está lá envolvido com as drogas, que deveria estar ali dentro da escola militar, eu acredito, que deveria o Governo de Estado repensar nessa política, e abrir vagas para que as crianças que realmente necessitam possam ocupar esse espaço, caso contrário, apenas poucos alunos terão o privilégio de acessar este tipo de escola.

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