Em decisão cautelar proferida na noite desta quarta-feira (16.07), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), validou os decretos presidenciais que majoraram as alíquotas do Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro (IOF), mas suspendeu a tentativa do governo federal de equiparar a operação conhecida como "risco sacado" a operações de crédito — movimento que criaria nova hipótese de incidência tributária sem previsão em lei.
A decisão foi proferida no âmbito das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 7827 e 7839, ajuizadas respectivamente pela Confederação Nacional do Comércio (CNC) e pelo Partido Novo, e da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 96, proposta pela Presidência da República. O caso ganhou contornos de conflito entre Poderes após o Congresso Nacional editar o Decreto Legislativo 176/2025 para sustar integralmente os decretos presidenciais, alegando desvio de finalidade arrecadatória.
O conflito se originou após o governo federal publicar uma série de decretos em 2025 que elevaram as alíquotas do IOF em diferentes modalidades. Os Decretos 12.499/2025 e anteriores promoveram aumentos que variaram de 0,0041% a 1,5% ao dia, dependendo da operação, sob justificativa de adequação da política monetária e estímulo ao crédito produtivo.
O Congresso Nacional reagiu aprovando decreto legislativo que sustou por completo as medidas, argumentando que as alterações teriam finalidade meramente arrecadatória — o que extrapolaria os limites constitucionais do poder regulamentar do Executivo em matéria de IOF.
IOF como instrumento de política econômica
Na decisão, o ministro Alexandre de Moraes reafirmou o caráter extrafiscal do IOF e a autorização constitucional prevista no artigo 153, §1º da Constituição Federal, que confere ao Poder Executivo competência para alterar alíquotas do tributo para fins de regulação econômica e política monetária.
A decisão restabeleceu a eficácia dos decretos presidenciais com efeitos retroativos, considerando válidas as justificativas técnicas apresentadas pelo Ministério da Fazenda. Entre os argumentos aceitos pelo STF estão a padronização normativa entre diferentes modalidades de crédito, a busca por neutralidade tributária e o estímulo direcionado ao crédito produtivo em detrimento de operações especulativas.
Moraes define limites: sim ao IOF extrafiscal, não à tributação sem previsão legal
"O IOF é um importantíssimo instrumento de regulação do mercado financeiro e da política monetária", destacou Moraes, acrescentando que "não se evidenciou desvio de finalidade nas alterações implementadas pelo Executivo, que se mostraram tecnicamente justificadas e alinhadas com objetivos macroeconômicos legítimos".
"Risco sacado": limite à inovação tributária
O único aspecto em que o ministro manteve a suspensão cautelar refere-se à tentativa de tributar as operações de "risco sacado" — modalidade financeira em que empresas antecipam o recebimento de valores de vendas a prazo mediante desconto, sem que haja efetiva assunção de dívida perante instituição bancária.
Moraes entendeu que os dispositivos do Decreto 6.306/2007 que buscavam equiparar esse tipo de operação a contratos de crédito tradicional invadiram competência reservada ao legislador, violando o princípio da legalidade tributária estrita.
"Nas operações de risco sacado não há assunção de obrigação financeira perante instituição bancária, inexistindo operação tecnicamente definida como de crédito", fundamentou o ministro. A medida foi considerada inovação indevida na definição do fato gerador do tributo, competência que a Constituição reserva exclusivamente à lei em sentido formal.
A distinção é relevante porque, diferentemente das operações de crédito tradicionais — onde há empréstimo com obrigação de devolução acrescida de juros —, no risco sacado a empresa apenas antecipa recursos próprios futuros, assumindo o risco de inadimplência de seus clientes.
Congresso: controle válido, mas com limites
O Decreto Legislativo 176/2025 foi considerado constitucional apenas na parte que tratava da tributação sobre "risco sacado". Nos demais aspectos, o STF suspendeu sua eficácia, reconhecendo que o Legislativo extrapolou suas competências de controle.
Moraes esclareceu que, embora o Congresso possa exercer fiscalização sobre o poder regulamentar do Executivo, não pode interferir em competências constitucionalmente atribuídas a outros Poderes. No caso do IOF, a alteração de alíquotas para fins extrafiscais é prerrogativa exclusiva do Executivo, desde que motivada por razões técnicas legítimas e não meramente arrecadatórias.
"O controle parlamentar sobre atos normativos do Executivo deve se circunscrever aos casos de efetivo extrapolamento das competências regulamentares, não podendo alcançar o exercício regular de atribuições constitucionais", pontuou a decisão.
O caso segue agora para análise do Plenário do STF, após manifestação da Procuradoria-Geral da República. A decisão cautelar de Moraes permanecerá em vigor até o julgamento definitivo, que deverá consolidar a jurisprudência sobre os limites do poder regulamentar em matéria de IOF.
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