O procurador-geral de Justiça de Mato Grosso, José Antônio Borges Pereira e o procurador Edmilson da Costa Pereira, da Procuradoria de Justiça Especializada da Cidadania e do Consumidor, em nota emitida nesta quarta (03.02), intitulada: “Vara Única de Saúde: solução ou engodo à falta de assistência ao cidadão?”, contestaram as declarações do governador Mauro Mendes (DEM), que classificou como “equívoco gigantesco” a decisão do Superior Tribunal de Justiça que retirou a competência da 1ª Vara Especializada de Fazenda Pública de Várzea Grande de julgar processos relacionados a saúde pública de Mato Grosso.
Mendes disse durante coletiva à imprensa que a criação da Vara Judicial Única de Saúde em Várzea Grande acabou com o que denominou de "máfia da saúde", que desviaria, segundo número por ele apresentado, cerca de R$ 100 milhões por ano para atender as ações judiciais relacionadas ao setor da saúde pública, “aproveitando da boa vontade do Poder Judiciário para roubar o dinheiro público”. “Nós gastávamos quase R$ 200 milhões por ano com essas judicializações. Depois que a Vara foi criada, essa despesa caiu por menos da metade”, acrescentou o governador. Veja matéria relacionada: Governador classifica decisão que “acabou” com Vara da Saúde em MT como “equívoco gigantesco”
Na nota, o MPE diz que ao justificar a instalação da Vara Judicial para apreciar as demandas da saúde direcionadas ao Estado em todo o território mato-grossense, o Tribunal de Justiça relatou que nas 79 comarcas de Mato Grosso tramitava significativo número de processos relativos à saúde que, concentrados em Vara Única, teriam maior dinamismo.
Porém, conforme nota do MPE, “decorrido mais de um ano, nota-se nos Relatórios de Atividades Forenses da Corregedoria-Geral de Justiça, hospedados no sítio eletrônico do TJMT, que tal meta não foi alcançada”.
“Em novembro de 2020, por exemplo, a 1ª Vara Especializada da Fazenda Pública de Várzea Grande (Vara da Saúde) iniciou o mês com o acervo total de 4.275 processos, mas apenas 238 foram sentenciados (40 sem julgamento do mérito e 198 com julgamento do mérito)” cita como exemplo.
Ainda, conforme o MPE, “a Resolução nº 09-TJMT não observou que significativo número de ações judiciais ostenta no polo ativo pessoas idosas que, pela legislação em vigor, gozam de tratamento diferenciado. Tal resolução ignora outras normas legais de caráter processual e hierarquicamente superiores, que determinam que as ações versando sobre direitos de pessoas idosas devem ser julgadas e processadas no foro do seu domicílio”.
“Mesmo em tempos em que predominam as relações por meio digital, é imperioso reconhecer que significativa parte da clientela do SUS que promove essas demandas não tem acesso a computador e internet, violando ainda o direito ao acesso à justiça” diz nota.
Segundo nota, o Ministério Público de Mato Grosso questiona, em vários outros recursos também em apreciação no STJ, a criação da Vara Única de Saúde e, por isso, “não pode aceitar que a matéria seja tratada com a simplicidade exteriorizada na manifestação do governador”.
“Inicialmente, vale frisar que é de natureza institucional a responsabilização civil, administrativa ou penal de todas as condutas de servidores ou particulares que resultem em desvio de recursos públicos. O nosso inconformismo com a concentração das demandas da área da saúde relacionadas às pessoas idosas em uma única Vara Judicial, está embasado no estreito cumprimento da legislação vigente” diz.
Para os procuradores, “a chamada Judicialização da Saúde é, na maioria dos casos, fruto da reiterada desconformidade na execução da política pública para o setor”. “Em regra, o Judiciário é provocado para dirimir conflito, mas, no caso, as demandas por serviços ou produtos para garantir saúde à população decorre da incompetência administrativa do Poder Executivo, que há muito precisa se estruturar, modificando e modernizando os meios de atendimento ao cidadão” enfatiza nota.
De acordo com eles, os gestores do Sistema Único de Saúde precisam sintonizar suas ações, visando a efetividade de atendimento ao cidadão, tratando-o como verdadeiro cliente. “Também é crucial o tratamento dos contratos na área da saúde com a rede pública, filantrópica e privada nos mesmos moldes dos demais contratos públicos, inclusive com gestores específicos que possam corrigir, a tempo, eventuais desconformidades e, sobretudo, que existam cenários de composição entre a administração e o cidadão, evitando a judicialização das demandas. O Ministério Público está à disposição para participar da construção de alternativas visando a atingir esse desiderato, aliás, como sempre fez” cita.
O órgão ainda lembra que o Conselho Nacional de Justiça recomenda e os Tribunais de Justiça nos Estados esmeram-se em adequar as suas estruturas de atendimento às demandas judiciais na área da saúde, em sintonia com as orientações técnicas e, sobretudo, sopesando os meios que evitem a litigiosidade, de forma a alcançar o objetivo almejado na demanda, em menor custo para a administração pública.
“Mas é insano insistir em alcançar esse objetivo, senão pela melhoria dos meios administrativos de resposta ao cidadão. O caminho é dotar toda a estrutura administrativa de capacidade de atendimento eficiente ao cidadão. As condutas não republicanas, consistentes em desvio do dinheiro público, devem ser investigadas pelos órgãos de controle interno do Executivo e por aqueles de Controle Externo do Estado” externaram os procuradores.
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