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Variedades Domingo, 12 de Agosto de 2018, 11:10 - A | A

Domingo, 12 de Agosto de 2018, 11h:10 - A | A

12 de agosto

Pai conta como a paternidade aos 68 anos mudou sua vida

OGlobo

Arquivo pessoal

frederico

O fotógrafo Frederico Mendes e os filhos

Nunca pensei em ser pai. Minha vida de jornalista era muito louca: hoje estava aqui, amanhã do outro lado do mundo cobrindo guerras ou terremotos. Ia sempre para a redação com o passaporte no bolso traseiro do jeans e, certas vezes, só voltava para casa um mês depois. Por força da profissão, achava o hábito de viver muito perigoso e era absurdo colocar mais gente nesse insensato mundo.

Até que em 1980 quase morri na guerra civil em El Salvador. Poucas horas depois de chegar lá, vi-me envolvido em um tiroteio cujo alvo era eu. Enquanto tentava fugir dos franco-atiradores, pensei: “Que droga; vou morrer, ainda não fiz nenhuma foto boa e não tive um filho”. Escapei; e a primeira coisa que disse para minha mulher quando cheguei em casa foi: “Vamos ter um filho?”


Gabriel nasceu no ano seguinte.

No começo da década de 1980, minha mulher estava começando sua vitoriosa carreira como fotógrafa e eu, que já estava estabelecido, não precisava trabalhar tanto. Então, eu levava meu filho à natação no clube e marcava fotos no meu estúdio só a partir das duas da tarde. Na época, eu era o único pai no meio de várias mães, o que parecia estranho para elas.

Quando Gabriel tinha três anos, retomei a vida de correspondente de guerra, me separei e fui fazer análise antes de ir para a África. A primeira coisa que disse foi: “Doutor, não sei se eu sou meu pai me abandonando mais uma vez ou se sou meu filho sendo abandonado por mim”.

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Nada tão estranho, explico, já que uma das últimas coisas que meu pai fez aqui no Brasil, antes de emigrar para os Estados Unidos, fui eu, pois nasci quase dez meses depois. Curiosamente, minha mãe, apesar de abandonada e da grande dificuldade em ser mãe solteira naqueles anos repressores da década de 1950, sempre me falava de meu pai sem ódio, com admiração e ressaltando suas qualidades. Só o conheci aos 24 anos, quando finalmente ele soube da minha existência. Ficamos grandes amigos e nos víamos várias vezes por ano, aqui ou nos Estados Unidos, até a sua morte, em 2002. Ele se tornou um carinhoso avô para o meu filho, seu primeiro neto. Não conheceu meu filho mais novo.

Lilian, minha quarta (e definitivamente a última) mulher, sempre quis ser mãe, mas eu ainda relutava em ser pai de novo. Como prova de amor, resolvi ter outro filho, mesmo beirando a terceira idade. Foi grande nossa luta de muitos anos com alarmes falsos, vários médicos bambambãs, muitos tratamentos, óvulos congelados, dolorosas injeções aplicadas na sua barriga. Quando estávamos pensando em adoção, ela ficou grávida.

Pedro nasceu saudável, tão cabeludo como eu e com os 20 dedos, que contei assim que abaixei a câmera na sala de parto. Curiosamente, uma enfermeira disse: “Parabéns, vovô!” Eu tinha 68 anos, idade mesmo para ser avô, coisa que aconteceria dois anos depois quando Gabriel e Jade tiveram Gael, meu neto. Neste agosto, Gabriel completa 37 anos e Pedro, 3.

Dias atrás, estava em um parque com meu filho e disse: “Vem com o papai, Pedro!” Uma menina de cinco anos que brincava perto me abordou, desconfiada: “Você não é o papai dele. Você é o vovô”. Como iria lhe explicar que tenho cabelos brancos desde os 30?

Decorei uma lista de homens famosos que foram pais depois dos 70, como Chaplin, João Gilberto, Mick Jagger, o magnata Rupert Murdoch, e até mesmo depois dos 80, como o ator Anthony Quinn e o pai do cantor Julio Iglesias, que teve um filho aos 90, em 2006.

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Agora sou eu quem agradece todos os dias à minha mulher por ter insistido em ser mãe, por Pedro existir e por ele ser meu filho. Só atravesso as ruas com o sinal fechado, e o antigo correspondente de guerra que não tinha medo de morrer fica fazendo planos de chegar pelo menos até os 95, só para poder vê-lo jogar futebol e basquete pelo Flamengo ou escrever seu primeiro livro ou roteiro. Se ele virar cantor sertanejo, juiz de futebol ou advogado de porta de cadeia, tudo bem. Só espero que ele cumprimente as pessoas ao entrar em um elevador, seja atencioso, generoso e solidário com os que precisam de ajuda e se torne um homem de bem.

Como já dizia minha sábia mãe: “A gente ensina o burro a encontrar água, mas não o pode obrigar a beber”. Sábias palavras de uma grande mulher, aliás, o melhor pai que eu tive: Leia mais: https://oglobo.globo.com/ela/gente/pai-conta-como-paternidade-aos-68-anos-mudou-sua-vida-22963262#ixzz5Nydklwq2 

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