O agente de trânsito Robson Pereira, de 41 anos, foi preso por suspeita de integrar e beneficiar uma facção criminosa em São Paulo ao aplicar multas e antecipar dados sobre operações de fiscalização. Servidor público há 20 anos da Prefeitura de Itanhaém, no litoral do Estado, ele foi identificado após investigação da Polícia Civil.
Pereira, também conhecido como Maquininha, é acusado de integrar a organização, que atua dentro e fora dos presídios no país, para garantir o funcionamento de um serviço de transporte clandestino de passageiros. Parte da quadrilha foi desarticulada durante uma operação deflagrada em abril de 2017 na cidade.
O servidor, segundo a delegada Evelyn Gonzalez, titular da Delegacia de Investigações Gerais (DIG), atuava como um agente duplo, pois utilizava da função para compartilhar informações sigilosas com a organização, que mantinha o serviço ilegal de transporte. Interceptações de conversas, com autorização da Justiça, provaram as suspeitas.
"Quando realizamos a operação inicial, tínhamos identificado Robson apenas pelo vulgo [apelido], Maquininha. Após a prisão de parte da quadrilha, nós conseguimos avançar nas investigações e verificamos que ele fazia parte do grupo para beneficiar a facção. As conversas deixaram muito claro isso", explica a delegada.
As investigações da DIG mostraram que Pereira multava e apreendida veículos de motoristas que não aceitavam participar do esquema ilegal coordenado pela facção, independente do motivo. O G1 teve acesso a algumas das conversas que foram interceptadas em aplicativos de mensagens de celulares do investigados:
Diálogo 1:
Interlocutor: Makininha, bom dia. Vou te mandar a placa de um prêmio branco que tá fazendo linha. Já conversei com ele, mas não tem jeito. Vê o que você faz aí.
Maquininha: Bom diaaaa. Tranquilo, você é parceiro. Manda, que nós resolve.
Interlocutor: Mandei aí.
Maquininha: A multa por transporte remunerado dentro do município é pesada.
Interlocutor: Ok.
Diálogo 2:
Interlocutor: Dá uma multa na [nome] do Up branco.
Maquininha: Preciso da placa.
Interlocutor: Quanto custa essa multa?
Maquininha: Logo pego. R$ 1.400. E o carro fica com problemas.
Interlocutor: Ao decorrer tem que dar mais.
Maquininha: Uma por semana.
Interlocutor: Ok.
Maquininha: Quandor for vender o carro não vai valer um real.
Interlocutor: Depois te passo outras placas.
Em outra conversa, ele utiliza a gíria "Boi de Piranha" para indicar que penalizou um motorista por não integrar o esquema. A expressão popular refere-se em sacrificar algo em troca de um benefício maior. O condutor foi multado e também teve o veículo utilizado no transporte clandestino guinchado pela prefeitura:
Maquininha: [placa] Pálio fazendo lotação. É de vocês?
Interlocutor: Não.
Maquininha: Prende?
Interlocutor: Demorô. Mete marcha.
Maquininha: Já era, guinchado. Game over. Não faz parte da equipe, vai de boi de piranha.
Interlocutor: Risos.
Além disso, quando não poderia interferir, o servidor também informava o bando sobre a localização e realização de periódicas blitz nas ruas e avenidas da cidade. O objetivo era fazer com que os carros mantidos pela organização criminosa não fossem multados ou guinchados em razão das irregularidades. Outra conversa mostra o alerta ao bando:
Maquininha: Bom dia. Atenção: operação hoje, às 9h. Cadê você, locão? Preciso falar com você!
Interlocutor: Boa.
Maquininha: Tá onde?
Interlocutor: Tô indo pro centro.
Maquininha: Passa aqui na ladeira. Rua da prefeitura. Se liga. COMANDO NO CENTRO. VÁRIAS VIATURAS TRÂNSITO e GCM [Guarda Civil Municipal].
Interlocutor: Blz. Que lugar?
Maquininha: Kallan.
Interlocutor: Beleza.
Maquininha: E Pernambucanas. E eu aqui.
Interlocutor: Beleza.
"Quando o prendemos na sexta-feira (18.05), ele nos alegou que mantinha contato com os integrantes da quadrilha para manter uma boa relação na cidade", diz a delegada. Como não há provas de eventual pagamento de propina, a suspeita é que ele pudesse se beneficiar para conseguir torna-se vereador. Em 2016, ele se candidatou, recebeu 69 votos e não foi eleito.
Maquininha teve a prisão preventiva decretada pelo juiz Paulo Alexandre Rodrigues Coutinho, da Comarca de Itanhaém, que entendeu que há provas suficientes da participação do servidor no esquema. O magistrado ordena, ainda, que a Prefeitura informe todas as multas aplicadas pelo agente de trânsito durante o período das investigações.
A Prefeitura de Itanhaém informou que o Robson tornou-se servidor público a partir da aprovação de um concurso para ocupar o cargo de agente de fiscalização de trânsito em 1998. A municipalidade disse ainda que está apurando os fatos, colabora com as investigações e que aguarda uma decisão final da Justiça sobre o caso.
O advogado do agente de trânsito, Carlos Antônio Ribeiro, afirma que o cliente é inocente. "Vamos pedir a revogação da prisão para que ele possa responder em liberdade. Ele tem bons antecedentes, emprego fixo e residência", declarou. A DIG de Itanhaém informou que continua investigando a participação de outras pessoas no esquema criminoso.
Entre no grupo do VGNotícias no WhatsApp e receba notícias em tempo real (CLIQUE AQUI).