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Variedades Quinta-feira, 10 de Outubro de 2013, 10:11 - A | A

Quinta-feira, 10 de Outubro de 2013, 10h:11 - A | A

Novela humilha personagem gorda e ensina que felicidade depende de marido

Embora com pinceladas cômicas, as desventuras de Perséfone têm desagradado uma parcela significativa de telespectadores.

do Uol

Na cena agendada pela Rede Globo para 10 de outubro, Perséfone (Fabiana Karla) perde a virgindade em "Amor à Vida", bem ao estilo dos conto de fadas: na noite de núpcias, após seu casamento com Daniel (Rodrigo Andrade). Experimentar os prazeres do sexo e conseguir um marido constituem o final feliz tão almejado pela personagem, que foi achincalhada por ser gorda durante toda a novela (até pelos personagens considerados "mocinhos").

Embora com pinceladas cômicas, as desventuras de Perséfone têm desagradado uma parcela significativa de telespectadores, inconformados com o tratamento dado a ela e que, agora, é recompensado com a conquista de um homem. Descontentes com o perfil da enfermeira –mostrada como ingênua, boba, desesperada para arranjar um parceiro–, blogueiras plus size chegaram a criar uma petição online para o autor Walcyr Carrasco mudar os rumos da personagem, mas não tiveram seus desejos atendidos.

Tanto o autor quanto a atriz Fabiana Karla defenderam que os momentos humilhantes da personagem servem para mostrar como os obesos sofrem preconceito na vida real e, de uma forma leve e divertida, conscientizar sobre o assunto.

Segundo especialistas em comportamento, no entanto, não é bem assim. Embora retrate, sim, algumas situações verídicas, Perséfone o faz de maneira caricatural e estereotipada.

"A utilidade do estereótipo é manter o preconceito intacto. Ainda que uma personagem de TV ou de cinema tenha a obesidade como característica, seria importante mostrar seus defeitos, suas qualidades e outras peculiaridades não relacionadas à obesidade", afirma o psiquiatra Adriano Segal, do Departamento de Psiquiatria e Transtornos Alimentares da Abeso (Associação Brasileira para o Estúdio da Obesidade e da Síndrome Metabólica).

"O físico não deveria ser o principal ponto de atenção. A mulher precisa ser mostrada como ela é, como um todo. Afinal, a pessoa vale pelo seu todo ou vale quanto pesa?", questiona o psiquiatra Arthur Kaufman, fundador e coordenador do Programa de Atendimento ao Obeso do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínica da USP (Universidade de São Paulo).

Machismo e preconceito - Na opinião da psicóloga Rejane Sbrissa, que trabalha com terapia para tratamento da obesidade, a trajetória de Perséfone reforça a ideia de que a pessoa obesa precisa ser sempre simpática, prestativa e bem-humorada para "compensar" o fato de estar acima do peso. "Ela se força a ser sempre legal para se sentir aceita e mais querida pelos outros", conta.

O psicólogo Marco Antonio de Tommaso, credenciado pela Associação Brasileira para Estudo da Obesidade, completa: "Faz parte do estigma da obesidade mostrar nas novelas e nos filmes a gorda boazinha de coração puro, que mantém os bons sentimentos mesmo que os outros caçoem dela. A gordinha precisa sobreviver e assume um personagem para atenuar a rejeição e a discriminação".

É preciso considerar que, na vida real, algumas mulheres se sentem mesmo mais valorizadas quando arrumam um namorado. No caso das que estão acima do peso, isso acontece devido à enorme pressão social que sofrem para emagrecer. "É comum familiares e amigos falarem que elas ficarão sozinhas, pois nenhum sujeito deseja assumir um compromisso com uma mulher gorda", declara Rejane Sbrissa.

Para a psicóloga especializada em imagem Marjorie Vicente, Perséfone também contribui para fortalecer outros preconceitos: "A gordinha é vista como solitária, não desejável. Apesar de toda a modernidade, ainda hoje a sociedade cobra que as pessoas se relacionem, namorem, casem e tenham filhos. E considera tudo isso menos provável para alguém fora dos padrões. Uma mulher solteira e acima do peso é vista como um caso perdido", diz. Por isso, Daniel é tido como um prêmio para a personagem de "Amor à Vida".

 

O estereótipo da desesperada

Antes de se envolver com o fisioterapeuta da novela, Perséfone viveu situações constrangedoras ao tentar conquistar outros rapazes. Ao exibir tentativas de sedução frustradas, a maioria por conta da forma física de Perséfone, a novela solidificou conceitos machistas de que é muito difícil aceitar que um homem atraente se interesse por uma mulher que não seja magra.

Da mesma maneira que as pessoas, em geral, aceitam melhor o grisalho do que a grisalha e um casal formado por um homem mais velho e uma mulher mais nova, do que o contrario, também encaram com maior naturalidade um gordinho acompanhado de uma mulher esbelta.

"Essa avaliação é resquício de um padrão sociocultural de uma época em que a mulher estava e tinha de estar submetida ao homem. Seus maiores valores eram a beleza dentro dos padrões e os dotes de esposa, como cozinhar, bordar, procriar, servir", afirma Arthur Kaufman.

A impressão é de que o homem tem mais direito de "estar em desvantagem" do que a mulher. "Há uma corrente de teóricos que acreditam que, com tantos avanços femininos, a ditadura do corpo ideal é uma forma de ainda deter a mulher. E faz sentido, já que a maior parte acaba cedendo à pressão", diz Marjorie Vicente.

Para Rejane Sbrissa, TV, publicidade e cinema deveriam enxergar a mulher obesa como outra qualquer. "Mostrá-las como pessoas independentes, bem-sucedidas, elegantes, paqueradas e amadas ajudaria demais as mulheres da vida real a se amarem e a se valorizarem mais. Não há estímulo maior do que ser tratado com respeito".

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