Ele perdeu um filho, morto em uma execução em 2008, e, cinco anos depois, outro de seus filhos foi sequestrado e morto em Salvador.
Negros, jovens e moradores de favela, os fihos de Lázaro são apenas dois dos milhares de jovens assassinados todos os anos com este perfil - uma realidade que deixar de ser "invisível", segundo defende a Anistia Internacional.
A história de Lázaro ilustra um quadro que associa diretamente os altos índices de violência no país a faixa etária, gênero e raça. Do total de 56.337 homicídios ocorridos no Brasil em 2012, 57,6% tiveram com vítimas jovens com idade entre 15 a 29 anos. Destes, 93,3% eram homens e 77%, negros.
Os dados são do Mapa da Violência, compilados com base no Datasus, com base em 2012 - o último disponível.
Três policiais militares são acusados pela morte de Ricardo, o filho que Lázaro perdeu em 2008.
Ele passava férias em Salvador e estava jogando bola com amigos na favela de Bate Facho.
Quatro homens chegaram em um carro, três deles desceram e começaram a atirar. Dois jovens morreram.
De acordo com as investigações e com testemunhas, há fortes evidências de que eles foram mortos por policiais militares.
Aos 21 anos, Ricardo era um acrobata experiente.
O caso ainda não foi julgado e, segundo Lázaro, já houve uma tentativa de arquivamento do inquérito.
Em 2013, seu segundo filho, Ênio, de 19 anos, foi sequestrado e morto, também numa comunidade pobre da capital baiana.
Lázaro recebeu no dia seguinte apenas um saco plástico com os documentos do menino.
"O jovem negro e pobre é o que mais corre risco de morte no Brasil. Estou pedindo socorro, pedindo ajuda. Quero que me deem proteção, a mim e à minha família, e que os casos sejam investigados, que se faça justiça", diz ele.
Para chamar a atenção da sociedade e cobrar políticas públicas e ações concretas do governo contra, a Anistia Internacional lança neste domingo no Rio de Janeiro a campanha "Jovem Negro Vivo".
Segundo a organização, o objetivo é colocar o assunto na pauta da opinião pública brasileira, além de coletar assinaturas para o manifesto "Queremos Ver os Jovens Vivos".
"São mais de 30 mil jovens com este perfil mortos por ano. É como se caísse um avião cheio a cada dois dias no país. Você acha que isso não deveria estar nas capas dos jornais?", questiona Átila Roque, diretor da Anistia no Brasil.
"A campanha visa a pressionar o Estado para a criação de políticas públicas adequadas, mas também sacudir a sociedade. Não é possível que tenhamos tornado este genocídio algo natural."
De acordo com os dados do Mapa da Violência, sete jovens morrem a cada duas horas no Brasil.
"É preocupante saber que parte dessas mortes é causada por policiais militares, agentes do Estado responsáveis pela segurança pública, especialmente no Nordeste onde há atuação de grupos de extermínio formado por policiais", diz a Anistia em seu site.
Para o professor Julio Jacobo Waiselfisz, organizador do mapa e coordenador da Área de Estudos sobre Violência da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), a situação piorou nos últimos 30 anos.
Segundo ele, em 1980, do total de homicídios, 19,6% eram de jovens. Em 2012, a taxa chegou a 57,6%.
"Não estou otimista. A não ser que o assunto se torne prioridade, a tendência é continuar piorando. Houve o Plano Juventude Viva, do governo federal, mas ainda é uma gota no oceano", diz Waiselfisz.
"Nem mesmo na África do Sul ou em outros regimes de apartheid segregacionistas se matou tantos negros como nos últimos no Brasil, uma democracia sem conflitos étnicos tradicionais".
Do total de 56.337 homicídios registrados em 2012, 14.928 eram de pessoas brancas e 41.127, de negras.
Em algumas cidades, a diferença é gritante. No ranking do Mapa da Violência, em 2012, a cidade de Santa Rita, na Paraíba, registrou dois homicídios de brancos e 85 de negros.
Ananindeua, no Pará, teve 12 mortes de brancos e 384 de negros. Já em João Pessoa, houve 13 mortes de brancos e 358 de negros naquele ano.