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Opinião Terça-feira, 05 de Março de 2013, 08:21 - A | A

Terça-feira, 05 de Março de 2013, 08h:21 - A | A

Como nasceram os Ovos de Páscoa

A irônica história do coelhinho da Páscoa, que foi podado pela indústria do chocolate e depois teve o seu próprio rosto transformado em símbolo da marca do produto

José Carlos Alcântara

 

Era uma vez um coelhinho que vivia em uma cidade do interior chamada Páscoa. Muito inteligente e questionador, ele foi visitar a capital e viu, com muita tristeza, que as pessoas gastavam todo o seu dinheiro com uns ovos de chocolate. Esses ovos eram símbolo de status, com seus papeis brilhantes, laços coloridos e, apesar de caríssimos, quem não desse um de presente era malvisto pela sociedade. Até mesmo os mais miseráveis se esforçavam para comprar pelo menos um ovo. Esse costume se espalhou por todas cidades e todo ano era um ritual comprar esses ovos de chocolate.

O coelhinho era muito talentoso e descobriu como fazer um ovo, ele mesmo. Como não estava limitado pela hierarquia e estrutura de uma fábrica, ele pôde inclusive melhorar o sabor e baratear os custos de produção. Voltando à sua cidade, montou sua própria estrutura de distribuição para levar os ovos aos habitantes do interior, pois como ele não era egoísta nem queria ver o povo explorado, resolveu ensinar a todos como fazer seus próprios ovos de chocolate. Bastava apenas cada um lhe dar um real e haveria chocolate para todos. A população da cidade achou a ideia estapafúrdia. Afinal, como aquele coelhinho esquisito que sempre foi tão questionador faria um chocolate tão bom quanto o das fábricas? Mas, aos poucos ele convenceu a todos da economia que fariam e da qualidade do seu ovo. Todos toparam e cada um lhe deu um real, pois estavam com água na boca e cheios de esperança de comer um ovo de chocolate. O coelhinho supervisionava toda a produção e dizia o quanto botar de cada ingrediente. O resultado é que o ovo de chocolate do coelhinho ficou delicioso, melhor que o das fábricas, e todo mundo comia muito até se fartar. O coelhinho mostrou para a população estupefata o que era um autêntico Ovo de Páscoa caseiro.

Agora chamado de "Coelhinho de Páscoa", ele ganhou fama e a notícia do ovo comunitário, agora chamado de "Ovo de Páscoa", percorreu os povoados. Para que comprar ovos caríssimos, se podiam fazer eles mesmos e ainda mais gostosos? A embalagem deixou de ter tanta importância. Só que a notícia da fama também chegou aos fabricantes de ovos de chocolate da capital, que não gostaram nadinha disso. Eles foram direto ao governador reclamar que, caindo as vendas dos ovos deles, a arrecadação diminuiria, gerando menos impostos e as fábricas fechariam, gerando desemprego e a conseqüente revolta contra o governo. Era preciso preservar a ordem da nação. O governador então pediu à polícia para intervir. Uma acusação contra o coelhinho foi imputada: quebra de patentes. Ninguém poderia questionar, pois a fórmula dos ovos de chocolate havia sido registrada pelas fábricas muitos anos antes e não importava se o chocolate e a forma do ovo foram criados pela natureza: as fábricas é que eram as donas de tudo. Enquanto isso, o coelhinho ia tranquilamente, de cidade em cidade, ensinando as pessoas que deveriam se unir para fazer o seu próprio ovo de chocolate. O interessante é que elas se interessavam em comer o ovo, mas não se interessavam muito em decorar a fórmula e nem em fazer o seu próprio ovo.

Mas os industriais logo concluíram que bastaria eliminar o coelho e, em pouco tempo, toda essa história de "ovo comunitário" viraria uma lenda. A polícia então agiu e prendeu o coelhinho. Alguns daqueles que o ajudavam conseguiram fugir. A polícia resolveu fazer do coelho um exemplo: sentou o pau em cima dele, para coibir no futuro qualquer tentativa de alguém querer repetir o que ele fez. O coelho morreu na cela com múltiplas escoriações. E o delegado de polícia depois se eximiu da culpa: "Deve ter sido um ajuste de contas entre ele e a população local. Soube que parte do povo estava revoltada, pois o chocolate que ele fez provocou diarreia em muita gente. Tentamos protegê-lo numa cela individual, mas você sabe, esse povo ignorante só resolve suas desavenças com a morte, eles invadiram então a delegacia e deu nisso..."

O médico legista (simpatizante do recém-fundado movimento underground do chocolate caseiro), ao retirar o pano que cobria o cadáver, notou que o rosto do coelho, banhado em sangue, havia deixado seu contorno impresso no tecido. Logo a marca virou um ícone de protesto contra o monopólio do chocolate. As poucas pessoas que faziam seu próprio chocolate a utilizavam em camisetas, relógios, aneis e virou até avatar de uma sociedade secreta. O símbolo virou uma coisa sagrada e cheia de significados esotéricos, a ponto das sucessivas gerações nem saberem mais o que aquilo significava originalmente. Até que um dia o símbolo foi ressuscitado pela indústria do chocolate (sim, a mesma que mandou matar o coelho!), justamente com o nome de "Ovos de Páscoa", para alavancar as vendas de seus ovos, utilizando o seguinte slogan "Experimente os ovos do Coelhinho de Páscoa, detentor da fórmula secreta(!) para fabricar o melhor chocolate do mundo!". A ironia é que a fórmula era a mesma da indústria que mandou matar o coelhinho. A marca vendeu tanto e se tornou tão popular que depois ele virou mascote da indústria que mandou matá-lo. Manteve a mesma fórmula e roubou pra si o nome "Ovos de Páscoa".

 

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