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Artigos Terça-feira, 27 de Setembro de 2016, 13:39 - A | A

Terça-feira, 27 de Setembro de 2016, 13h:39 - A | A

Opinião

De Mato Grosso para o mundo

                                                                                                                                                         por Leandro Carvalho*

O primeiro documentário sonoro do mundo foi feito em Mato Grosso em 1931. Intitulado “Matto Grosso, the Great Brazilian Wilderness”, foi resultado de uma grande expedição que reuniu um grupo de cineastas de Hollywood com “talkie” câmeras de última geração, cientistas da Universidade da Pensilvânia, caçadores ligados ao The Explorers Club de Nova Iorque, e o artista e aventureiro russo Vladimir Perfilieff, que liderou a aventura. O principal objetivo dos viajantes, como noticiou o jornal New York Times na época, era a realização de um filme que tinha como escopo “a estória de um homem solitário vivendo na selva, mostrando sua rotina e os perigos que enfrentava".

Estas e outras estórias fascinantes estão sendo pesquisadas pelo professor doutor norte-americano Eric H. Hobson, da Universidade de Belmont, em Nashville, Tennessee. Ele esteve recentemente conosco por ocasião do lançamento do edital de apoio à produções cinematográficas mato-grossenses da SEC/MT em parceria com a Ancine/FSA. Eric conta que nos primeiros anos da década de 1930, graças aos boletins radiofônicos em tempo real que o New York Times levava ao ar todo sábado à noite, muitos cidadãos americanos ouviam a palavra "Matto Grosso" com frequência, mesmo sem conseguir pronunciá-la ou apontar no mapa onde estava aquele território.

Nesta época, E. R. Fenimore Johnson, filho do fundador a Victor Vitrola (Victor Talking Machine) E. R. Johnson, se tornara interessado nas novas tecnologias de som e imagem. Ele e seu pai eram membros da diretoria do Penn Museum e se tornaram muito ligados ao desenvolvimento de coleções de filmes, ao ponto de publicarem um manual sobre o correto armazenamento de filmes em museus e arquivos. Em 1930, E. R. F. Johnson foi convidado pelo seu amigo e ex-colega da Universidade da Pensilvânia John S. Clarke e pelo Captão Perfilieff, a integrar e financiar uma grande expedição para Mato Grosso com o objetivo de realizar filmagens zoológicas e etnográficas. O orçamento da expedição excedia a casa dos cem mil dólares, em valores da época, parte do qual esperavam reaver com a receita do filme.

Antes de partir, ele deu uma entrevista ao jornal New York Times demonstrando que a expedição tinha sérios propósitos e que tinha plena consciência que o grupo faria história, tanto no que se refere à tecnologia cinematográfica, quanto à produção de conteúdo. “These frontiers are rapidly disappearing. This is one of the last, for it won’t be long before the Brazilians will push in there, and the last of the native languages and customs will start disappearing. Much valuable knowledge of peoples, animal and plant life will thus be lost, as far as the world’s history is concerned. It is our intention to preserve as much of this as possible; we hope to be the first expedition to bring back actual sound recording films taken in the jungle” (NYT 3/6/31).

O resultado foi extraordinário. A nova tecnologia possibilitou o registro de sons simultâneos às imagens, deixando incríveis filmagens dos povos Bororo, Yawalapiti, e outros, em que podemos perceber a força de sua música como parte fundamental de seus rituais; ou o som dos motores do avião anfíbio que a expedições trazia junto a muitas toneladas de equipamento, incluindo um carro conversível!

Os cineastas que integraram a expedição traziam uma “Mitchell Camera” especial (das duas existentes no mundo) que, pela primeira vez na história, gravou em campo imagem e som simultâneos, de forma sincronizada. O que seria um longa metragem ficcional acabou virando um documentário sonoro, com incríveis imagens da região, dos animais e dos povos indígenas. A expedição trazia um time de profissionais importantes, com produções consolidadas. O filme Tabu, por exemplo, do cinematógrafo americano Floyd Crosby, que integrava a expedição, venceu o Oscar de Melhor Cinematografia em 1931, exatamente no momento em que ele filmava em Mato Grosso. Ele soube da conquista mais de um ano depois, quando voltou para sua terra natal.

Grande parte destas imagens está arquivada na Universidade da Pensilvânia, incluindo alguns filmetes temáticos dedicados ao Xingu ou aos Bororo (editados nos anos 1949), por exemplo, que podem ser acessados on-line no portal archive.org, britishpathe.com, ou no site da Universidade.

A Fazenda Descalvados, no pantanal mato-grossense, serviu de base para este grupo, assim como para muitos outros que buscavam a cidade de Cáceres como base de operações de suas aventuras, incluindo o presidente Theodore Roosevelt que por ali passou em 1914 juntamente com o Marechal Rondon. Durante a I Guerra Mundial, com um rebanho de mais de trezentas mil cabeças de gado, a Brazil Land, Cattle and Packing Company, proprietária da Fazenda, era uma grande fornecedora de carne enlatada para os exércitos aliados. O preço da carne era tão alto que fazia o negócio lucrativo mesmo com a complexa logística para fazer o produto chegar a Europa. Com o fim da Guerra, o preço da carne caiu e o local foi sendo abandonado, até ficar em ruínas.

É especial a história da produção audiovisual em Mato Grosso. Muito ainda está para ser descoberto, registrado, e difundido. O professor Eric H. Hobson é um dos que vem se dedicando a este resgate, dando uma extraordinária contribuição a cultura mato-grossense e brasileira.

Leandro Carvalho é secretário de Cultura de Mato Grosso

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